Ultimamente, tenho feito minhas viagens sozinha. E tenho recebido ainda muitas indagações de conhecidas.

“Qual teu problema?”

“Está indo encontrar um boy misterioso e não quer falar para a gente?”

“Porque não coloca no grupo? Acho que fulana se interessaria em ir com você”

Existe um motivo muito profundo, muito peculiar e que matutei por séculos até chegar nessa conclusão porque não tenho outras pessoas viajando comigo:

PORQUE NÃO QUERO.

SIMPLES ASSIM.

Creio que a partir dos 40 anos, a gente fica mais crica. Mais seletiva. Em palavras mais justas, não consegue mais suportar o outro 24 horas.

Em meus 20, 30 anos, eu já viajei com muitos amigos recém-feitos, amigos de décadas, parentes. E me submetia a patadas, ranços, vontades que não a minha, porque queria fazer o melhor pelo parceiro ou pelo grupo.

E continuo sendo assim até hoje. Mal de libriana. Ou de mocinha japonesa. Eu quero que a companhia que veio comigo se sinta bem. Então, na medida do possível, eu faço as vontades do grupo, ou tento conciliar ao máximo as vontades de outros. A viagem não deixa de ser muito boa. Mas não é a minha viagem.

Digo que hoje, do alto dos meus 48 anos, eu não tenho a menor paciência para chiliques e patadas desnecessárias, folgadices, sem noções. Eu parto logo para a vingança em dose dupla da que recebi. Por isso, eu procuro viajar somente com amigas que eu conheço bem, e olhe lá. Tenho amigas de longuíssima data, quase irmãs, mas já sei que viajar com elas pode dar problema, e até uma estremecida na amizade.

Isso acontece, e descobri em minha maturidade, porque as pessoas são pessoas, com todos seus defeitos e tiques, e eu me incluo. Ninguém é perfeito.

A gente tem um amigo que a gente ri muito quando se encontra, e ele gosta de tirar sarro de sua cara (mas não faça o mesmo com ele), e tudo bem numa roda de bar. Agora , 24 horas durante 5 dias, começa a pesar.

A gente tem um amigo que quer economizar em tudo, até nos menores confortos, mas que abre a mão para festas para encontrar possíveis bofes. Tudo bem isso uma vez ou outra, mas não em 10 dias.

E por aí vai. São pequenos detalhes no dia a dia que azedam uma viagem, por motivos bobos.

Eu vou contar uma coisa para vocês que aconteceu em Nova York agora. Eu estava no Central Park, definitivamente feliz e só, depois de 2 horas andando e descobrindo coisas muito legais (cantinhos escondidos, uma lojinha, uma cafeteria), eu cheguei na Bethesda Fontain, que é um marco de lá, cenário de vários filmes e gravações. E o lugar era realmente bacana, e tinha um cara tocando violino lindamente.  Fiquei uns 15 minutos apreciando a cena.

De repente, um rapaz muito bonito veio me pedir para tirar uma foto dele . Ele apontou a namorada, que estava longe, e que estava louca para ir embora, e como ela não quis ir até ele, ele pediu para tirar foto dele sozinho mesmo. Vimos que ambos eramos brasileiros e conversamos rapidamente, ele estava maravilhado com o lugar, queria ficar o dia inteiro explorando o parque, mas como a  namorada já tinha ido umas 5 vezes (como eu) ela já estava de saco cheio e querendo ir embora.

A namorada finalmente veio atrás dele e começou uma briga das feias. Ela dizendo que tava morta, que só pensava em chegar no hotel, e ele de papinho com mulheres.

Olha, eu sou amiga das mulheres sempre, e mesmo nessa situação eu não julgo, porque vai saber o que se passou antes (vocês, né homens), então eu calmamente disse a ela que o bofe estava sim querendo tirar foto de casal, mas ela se afastou e a primeira coisa que ele fez foi apontar que estava com a namorada.

Ela sorriu meio sem graça, pediu desculpas, e disse que já estava andando o dia inteiro, que fizeram juntos a maratona de NY e por isso estava esgotada e ele querendo ficar tirando foto daquele lugar.

Tirei a foto do casal, eles se despediram gentilmente de mim, só para depois que eu virei as costas, eles começaram a discutir novamente.

Fiquei um pouco triste, porque lembrei de minha situação em 2017: eu tava viajando com meu namorado , e a viagem estava muito gostosa, dessas para ficar na memória quando a gente partir. Só que em dado momento, teve uma briga séria, por conta de besteira mesmo, e azedou o clima. A gente contornou, mas fica aquele mal estar. Eu, por exemplo, não lembro dessa viagem com muito carinho.

O que estou tentando dizer a vocês é que se vocês toparem viajar sozinhos, com a companhia de nós mesmos, e conseguir aproveitar isso sem neuras, o céu será o limite.

A gente começa a se limitar dependendo de companhia para viajar, porque antes mesmo de agendar uma viagem, você precisa conciliar a data do outro, o budget do outro, o período do outro, e os lugares que ele quer visitar.

Eu confesso que já tenho as minhas restrições e não são poucas: não consigo ficar em hostel, em hotel com banheiro compartilhado, se a nota de limpeza for baixa eu não consigo, se for longe da cidade já fico de mal humor, odeio gastar grana com transporte privado, mas  gosto de fazer 10 refeições por dia. Imagine alinhar isso com as vontades e restrições de outros.

Não vou falar que não existem problemas quando você viaja sozinha.

Sim, existem. Você está mais vulnerável, e sem ninguém do seu lado, você se policia mais . Não vai tomar uber toda hora porque quem paga é só você, além da hospedagem (Nova York então foi uma tragédia, quase 1500 reais por dia). As vezes dá aquela solidão porque existem certas situações que é muito mais divertida compartilhada (olhar as pessoas num café, fazer compras em mulheres, experimentar maquiagem, conhecer um bar novo).

Por outro lado, existem muitos prazeres de viajar sozinha. E quantos!  Você decidir acordar no horário que quiser, sem combinar com o outro. Voltar e ficar de boas no hotel porque cansou as pernas. Ficar duas horas em coisas bobas que só você aprecia, como olhar esquilinhos no parque, fuçar cada quinquilharia divertida de uma loja descolada, decidir ir num pub tomar umas porque ficou com vontade e quer ir em 10 minutos, não uma hora, porque senão bodeia.

E existe algo muito forte que só você se permite quando está em viagem: uma conexão com você mesma. Parece frase de coach de Instagram, mas a verdade é que num ambiente diferente de sua casa e escritório, você tem tempo de questionar sobre sua vida, as pessoas com quem se relaciona, suas ações. Eu aproveito para pensar muito na relação com meus pais, de fazer um checkup de minhas emoções, de minhas próximas ações.

Por isso, ultimamente, tenho marcado as viagens em segredo, não porque eu não ame minhas amigas e não queira elas em minhas viagens, mas porque algumas viagens a gente tem que fazer sozinha mesmo. E tá tudo bem.

A hora que vocês descobrirem que viajar sozinho é uma tremenda de uma escolha e não a única que sobrou, verão que o mundo é o limite. Espero do fundo do coração que vocês possam viajar muito sozinhos .

Beijo no coração e aqui é curintia.