Tem uma crônica fantástica do Walcyr Carrasco, publicada na Revista Época, intitulada “Pentimento ou ser outra pessoa”, e narra as possibilidades de vida, tudo o que ele podia ter sido, e acabou sendo o grande escritor que ele é hoje, graças a um encontro num ônibus, do nada.
Quando você faz 40 anos, você começa a refletir também suas escolhas, e todo o caminho que você percorreu até chegar onde você está.
E daí começam as lembranças das bifurcações: aqueles momentos onde você se vê obrigada a fazer escolhas.
Bifurcações bobas: Escolher entre o boy loirinho bonzinho e o boy moreno e magia, mas canalha. Claro que o boy moreno te decepcionou depois. Claro que você se pega às vezes se remoendo que está sozinha porque deixou de apreciar os boys bonzinhos que passaram por sua vida, e por eles não serem tão magias, tão canalhas, você perdeu a chance de ser feliz e ter um relacionamento estável.
Bifurcações sérias: Depois de me formar, estava dividida entre ir para a empresa fundada pelo meu pai, e um programa de trainee que passei no Banco Itaú. Lembro como se fosse hoje: adorei todo o processo, e foram 5, uma odisséia. Adorei as pessoas com quem conversei, as meninas do RH que me selecionaram, a idéia do programa, de conhecer tanta gente nova, talvez novos amigos, novos namorados, novas viagens de trabalho.
Na empresa do meu pai, não poderia ter esse incremento de vida social, nem perspectivas amorosas. Mas a empresa era quase minha, né?
Fiquei na empresa por quase 20 anos, de 1999 a 2016. Agora fechamos a empresa, após muitos anos de gloria, tristezas, alegrias, mas que valeram a pena. Fechei com um puta orgulho, e copiei na página seguinte minha declaração que postei no facebook e que me inundaram de mensagens de carinho e torcida por mim que me levaram às lagrimas. A vida segue.
Pinta às vezes uma recordação de como teria sido minha vida no |Itaú? Sim.
E tem as bifurcações que você não teve escolha. Foi. Foi a perda de uma pessoa muito querida aos 23 anos que me fez perceber que era uma menina muito mimada e chata, e que pessimismo e churumelas são 100% criadas por você, e me fez levar a vida de forma muito mais leve e espirituosa.
Foi o roubo traumático em minha casa em Interlagos, que me fez ter vergonha na cara de morar ainda com meus pobres pais e sair para morar sozinha. Que depois daquele evento, eu podia enfrentar qualquer coisa, pois estava viva.
Daí eu penso: e se nunca aqueles ladrões não estivessem entrado em casa? Eu provavelmente estaria, sem dúvida, ainda morando com meus pais, num relacionamento difícil com minha mãe, com crise de identidade, com imaturidades típicas de quem mora ainda com pais, e não seria 30% da mulher que sou hoje.
Penso muito nas escolhas profissionais. Podia ter bancado a porraloka e ter me jogado num curso de teatro, coisa que sempre tive paixão por fazer e assistir.
Podia ter continuado meu estágio numa grande multinacional americana de tecnologia e lá ter ficado, e ter casado com algum funcionário de lá, como algumas meninas fizeram, e ter construído uma casa em Alphaville, com quintal e cachorro.
Podia ter aceitado o emprego de outra multinacional francesa, depois de um estágio superprodutivo com a melhor chefe que tive, e ter talvez feito carreira internacional. Ou, como era super perto da minha casa em Interlagos, ter ficado minha vida lá.
Em termos financeiros, nunca me arrependi. Pudera. Como verão nos capítulos onde falo de finanças, sempre procurei poupar pelo menos 30% do meu salário. Não raro, poupei mais de 50%, mesmo com as viagens que fiz, o guarda roupa lotado, todos os finais de semana na rua.
Poderia ter sido mais louca, ter largado a firma e ter viajado o mundo em 1, 2 anos sabáticos, mas não é algo que me arrependa.
Em termos de amigos: os amigos que tenho hoje tenho orgulho de tê-los. Os que se afastaram de mim ou me afastei deles, também não me arrependo. Coisas da vida. Errei com alguns, fui bondosa demais com outros, cresci e mudei. Uma coisa acho importante: tenha sempre renovada sua base de amigos, faça novos, mas não se esqueça daqueles mais antigos. Acho amigo antigo que você mantém uma prova forte de seu caráter. Amigo que te aturou nas épocas chatas e difíceis, amigo que olha nos seus olhos e sabe o que você está pensando sem falar nada.
E os amores? Ahhhhhhh. Estes são material eterno para nossa minhocação. Estou sozinha e penso muitos naqueles que se foram, naqueles que recusei, naqueles que sumiram. Mas acredito que todas, solteiras, casadas ou compromissadas também pensem em seus antigos amores. De verdade, mesmo aqueles boys magia negra ou encontros desastrosos, guardo com carinho no coração. Aqueles que deixaram marcas mais profundas, mesmo o tempo as cicatrizam, as deixam mais leves e se tornam nossa propriedade.
Minha teoria é que quando você chega aos 40, já fez tanta cagada na vida e alguns acertos, que você se torna mais resiliente para o que der e vier. E faz escolhas, se não mais acertadas, com maior ponderação. Então, as bifurcações da vida não servem para você se crucificar do que fez ou que deixou de fazer. É o seu legado, o seu caminho. Abrace-o e siga em frente. Ainda temos mais da metade da estrada a percorrer.
Texto que nos faz refletir. Imagem que nos faz voltar no tempo das nossas escolhas, mas elas não param. Sigamos em frente.
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