
Estes dias me reuni online com algumas amigas quarentenárias (todas na faixa de 44, 45 como eu) e aprofundamos um assunto espinhoso: a tal criação dos filhos e redesenhar o significado de uma pessoa bem sucedida, que venceu na vida.
Claro que para amenizar a seriedade do assunto, foram necessárias algumas várias garrafas de vinho. E logicamente, nosso senso de amizade para não pisar no calo da outra.
Embora eu não seje mãe, consegui participar de igual para igual na conversa já que tive a criação de meus pais como base para contar o meu ponto de vista.
A maioria do meu grupo teve criação rígida japonesa e alemã.
Isso quer dizer que nascemos e fomos criadas com conforto e segurança, contudo nada era de graça. Estudamos nas melhores escolas , tínhamos alimentação regrada por nossas mães em tempo integral, mas luxos secundários como roupas e tênis de grife, só com nosso dinheirinho mesmo (e não mesada, com trabalho).
Desobedecer aos pais era algo impensável . Teve sim alguma palmadinha ou outra, castigo e punições por malcriação ou por desrespeito. Não era essa moleza de hoje.
Daí já começou uma discussão fervorosa no grupo: algumas defendiam a criação rígida, outras defendiam uma criação mais igualitária, já que as crianças de hoje não são como as crianças de antigamente.
Para o bem e para o mal.
Para o bem: são crianças mais politizadas, mais conscientes, menos infantis (essa eu fiquei na dúvida se é para o bem ou para o mal). Eles são capazes de entender e discutir assuntos conosco que em nossos tempos de infância, jamais teríamos essa compreensão tão adulta.
Para o mal: houve uma “gourmetização” generalizada da precocidade das crianças. A maioria sim possui um entendimento maior do mundo e de assuntos adultos, mas é superficial, já que estamos na geração internet de leitura rápida e fake News. O acesso fácil a conhecimento raso pode transformar potenciais crianças prodígio em adultos frustrados e incapazes de serem independente financeiramente.
Eu vou parar por aqui porque isso deixo para as mães que estão lidando com isso. O ideal é uma educação rígida que eduque a criança de fato, ou uma educação mais leve, mais amizade e menos pai e filho e mais contestadora? Ou um meio termo (duro de ser obtido!)?
E daí entramos em um assunto igualmente espinhoso:
O que é ser uma pessoa bem sucedida? O que significa que seus pais acertaram na criação?
É ter conseguido mais sucesso profissional e dinheiro que seus pais? Para muitas e senão a maioria (não admitem, mas pensam assim) é a definição clara. Nesse ponto só conheço uma amiga de centenas (e digo centenas mesmo) que alcançou uma posição maior ainda de que seus pais . Como disse, vale o referencial: todas nós viemos de pais pobres que se abastaram em sua vida adulta .
No meu caso, meu pai veio de uma família de 10 irmãos, muito simples no interior de São Paulo e conseguiu sucesso como empreendedor. Dificil superar essa trajetória, e nem eu nem meus irmãos hoje, com 40 e 50 anos queremos ser empresários e tocar firma com 100, 300 funcionários.
Eu também não tive e não criei 3 filhos com meus genes, nem de terceiros.
Isso me torna um fracasso? Na concepção da maioria sim, talvez.
Eu me considero uma pessoa bem sucedida. Ponto.
Porquê?
Porque meu referencial de ser sucedida é diferente da maioria. Não estou falando isso para me gabar ou me defender. Falo isso de coração mesmo.
Para mim, uma pessoa adulta bem sucedida é aquela que consegue viver a vida de acordo com o que ela quer. Claro que sem incomodar o mundo e de quebra fazer algo bom que acrescente a outras pessoas. Ou seja, para o mundo é bom você existir.
E sim, tem que ter alguns parâmetros: ter conquistado sua independência financeira, ter conseguido superar e conviver com seus traumas, ter orgulho de você, e estar em paz e confiante com você mesma.
Durante quase metade da minha vida, eu vi sentido em tocar uma empresa (com minha família) , ser responsável por 100 funcionários, ter o glamour de viver como empresário do ramo comercial e decoração.
Depois que conquistei minha independência financeira, conseguir viajar meio mundo através das poucas férias que tinha por ano, e passar por alguns sustos de saúde e fatalidades que quase tiraram minha vida (e vendo tantos outros de minha idade irem tão cedo), minhas prioridades mudaram.
A vida é uma só mesmo. E eu não queria morrer fazendo o que fiz durante 20 anos. A partir dos meus 40 anos, continuar fazendo o que sempre fiz seria mais para que os outros não falassem que eu fracassei ou desisti.
Quando tive um susto de saúde, me toquei que a opinião dos outros não vai te salvar no fim da vida. Nem te confortar das decisões que você tomou.
Hoje eu trabalho bem menos pelo lado financeiro e ainda escuto gente (amiga até próxima mesmo) que eu não faço nada e apenas viajo. Desejo que seja isso no futuro mesmo. Escuto, faço piada e bola pra frente. Não preciso ser fachada para ninguém, nem para meus pais.
A questão é hoje eu poderia mesmo ficar só nas viagens e deixar de trabalhar 100%. Se elas não trabalharam e guardaram o suficiente o problema é delas. Não venham botar olho gordo em mim.
Mas realmente a vida 100% ficar de boa ainda não é para mim. Tenho aquele ímpeto de ainda produzir, de fazer acontecer, e porque não (me julguem!) ganhar dinheiro.
Claro que não é minha prioridade única como era nos meus 20 anos, e me orgulho disso. Se eu conseguir fazer aliado a alguma causa minha (hoje dedico 30% do meu tempo para um trabalho voluntário que estou amando) será o melhor dos mundos.
Ser bem sucedida para mim é poder nas minhas viagens viver sem celular e sem a necessidade de estar conectado para resolver problemas de trabalho, depois de ter conquistado a independência financeira.
Vamos a questão de ter filhos.
Eu nunca tive vontade de ser mãe, e mesmo admitindo que em meus últimos anos férteis me veio uma certa insegurança de não ter tido filhos até agora, não é algo que eu me desespere.
Porque deveria me considerar uma pessoa menos bem sucedida do que minhas amigas que tiveram filhos? Como já disse, a opinião dos outros no final da vida nada vai te importar. Muitas queriam de fato ter filhos, outras tiveram para segurar o boy, outras tiveram no susto e na surpresa, e tá tudo bem. Elas estão bem e eu também.
Por isso eu vejo que uma pessoa bem sucedida é algo objetivo, único, sem comparação com seus antecedentes ou semelhantes.
Isso vale também para nós mesmos. Nada de enaltecer suas decisões e sucesso baseado na miséria ou fracasso dos outros. Quando eu vejo alguém dizendo que “pelo menos eu não sou que nem fulano…” me dá nos nervos e denomina sim, uma pessoa que tem pouca convicção dela mesma. Outra coisa: vocês jamais me verão defendendo minha posição de solteira feliz sem filhos porque não queria ser que nem fulana com suas desgraças. Cada um com sua trajetória e seus parâmetros.
Você, minha amiga ou meu amigo, que conseguiu pagar por conta suas parcelas (ou seu aluguel) da casa própria, que não pede dinheiro a ninguém para viver sua vida, que consegue aproveitar da vida o que ela tem de melhor para oferecer e dormir de consciência boa , se considere um bem sucedido . É só isso. Não se compare a seus amigos, a seus pais, a seus irmãos. Eles são eles e você é você.
E ainda tem as tais exceções: talvez você ainda não consiga pagar as parcelas da casa própria ou optou por outro estilo de vida, e desde que você carregue suas escolhas e não faça mal para outros, está tudo bem. Conheço amigas que agora estão começando a parcelar o sonho da casa própria, por n motivos. Algumas porque não guardaram dinheiro mesmo, outras porque ajudavam sua família.
O importante para ser bem sucedido é sonhar e seguir o seu sonho, pessoal. Tem gente que sonha em ter uma família, tem gente que sonha em ter uma família, e na pandemia, tem muita gente que sonha em se curar e ter dias bons. E em vez de comparar, o ser humano deveria respeitar e apoiar o sonho do outro.