Vou começar minha fala contando de um episódio da vida do meu pai, quando ele dirigia sozinho a Recege, e era um dos membros da Aremasp. Ele estava com minha mãe, Maria, e seus amigos e concorrentes de lojas de material para construção, num trem rumo ao MontBlanc, na Europa.

Em dado momento ele cochilou e minutos depois ele acordou assustado, com aquele olhão dele arregalado, pois a paisagem mudou completamente, tudo branquinho.

“Morri? To no céu?”.

A turma caiu na gargalhada. Um deles “o Nishi? De jeito nenhum que ele vai pro céu quando morrer. Direto pro inferno!”

O meu pai era a estrela da festa. O motivo das risadas. Todo mundo gostava dele, de verdade.

Eu discordo desse amigo dele. Encapetado ele era. Mas que coração gigante ele tinha!

 Eu tenho certeza que ele está no céu hoje, comendo seu joelho de porco, com sorvete e sua birinight, com o cabelo pretinho e olhando a gente lá de cima, inconformado como metade do povo aqui tá com o cabelo todo branco.

Esse era o meu pai. Vaidoso, mas com uma mente brilhante, talvez a pessoa mais inteligente que já conheci na minha vida.

Eu poderia ficar aqui falando horas sobre as inúmeras histórias que ele construiu ao longo de seus 84 anos. Anos que ele viveu intensamente, e viveu uma vida gloriosa.

Pois afinal,  ele antes de tudo, era um excelente contador de histórias.

Desde quando ele saiu de Marília ainda adolescente, foi morar numa pensão sozinho, viajou o mundo, foi um empresário bem sucedido, uma família que o amava.

Desde seu olhar afiado para os negócios, enxergando em cada esquina uma oportunidade, e uma oportunidade para fazer graça com o outro, desde os porteiros corintianos até seus amigos e próprios familiares. O bullying com ele era leve, divertido.

Mas quem é amigo dele, quem é da família, vamos eternamente lembrar de suas histórias, então não vamos nos ater aqui a elas.

Aqui eu vou deixar algumas dicas de vida para vocês, que ele me confidenciou nos seus últimos dias. Vou deixar 5.

Primeiro: nunca é tarde e não deixe de realizar seus desejos. Ele teve os melhores carros. Com quase 80 anos, ele finalmente venceu seus próprios anseios e comprou o carro dos seus sonhos uma Mercedez. Quem conhecia o Nishi sabe que o orgulho dele era ser chamado de japonês judeu. E ainda não queria escurecer os vidros, para todo mundo saber que ele estava dirigindo o carro. Tenha um barco se quiser. Viaje muito enquando tenha saúde.  Coma tudo do melhor enquanto você pode.

Segundo:  faça sua vida valer a pena. Não culpe ninguém . Ele chegou onde queria. Como diz o filho dele, Newton, ele viveu a vida que quis, até os seus últimos momentos.

Terceiro: pinte seu cabelo. Faça plásticas. Cuide de você mesmo. Ele teria feito com 80 e poucos anos uma cirurgia para encolher suas bolsas debaixo dos olhos.  Não se entregue à sua idade biológica.

Quarto: Tenha uma religião. Ele sentiu falta de ser mais devoto. Porque ele lutou que nem um rei este ano. Ele queria viver muito mais. Ele queria voltar a dirigir. E nunca achei que ele falaria isso, mas ele disse com toda sinceridade, num momento de tanto medo e que ele sentia o fim, ele queria esse amparo que ele não construiu em vida.

Quinta e última: o mais importante na vida é os laços que você cria com outras pessoas. De nada adiantaria o que ele conquistou , o império que ele fez, se não tivesse minha mãe do lado dele, incansável, dormindo ao pé de sua cama, na uti, dormindo todas as noites de hospital juntos, trazendo as comidinhas., fazendo as vontades dele, ele nunca se sentiu só.

Ele estava muito lúcido, em seus últimos dias. Tivemos grandes conversas. Sobre a vida dele, sobre as histórias e ele me dava dicas sempre sobre:

  1. Ganhar mais dinheiro
  2. Arranjar alguém como ele arranjou minha mãe.

Acho que não preciso explicar e provar o amor que todos seus filhos e netos terão sobre ele até o final de nossos dias, e isso é o legado emocional que importa.  Posso apenas dizer que estivemos com ele em seus últimos momentos de vida, seus últimos batimentos e nos despedimos dele de todas as formas possíveis.

Pai, você apenas passou para o outro lado. Você estará conosco em nossas vidas, amparando a mãe, viajando conosco, em nossos almoços, jantares, em nossas próximas etapas de vida.

Nos reencontraremos todos um dia,  para a eternidade, para ficar num belo hotel fazenda, comendo uma feijoada, tomando uma bebidinha e sendo o único que não pescou um peixe.

Te amamos! Que gratidão por termos tido você por este tempo!