Tem dias que eu saio da minha aura poliana e positiva da vida, e faço uns textos pessimistas.

Mas com tanta desgraça nos noticiários, é impossível eu não me expressar sobre como o mundo está insano.

Em menos de uma semana, vimos (literalmente, porque a cena terrível foi totalmente gravada) um negro  sem antecedentes criminais, desarmado,  ser imobilizado por 3 policiais e morto por por causa de uma nota supostamente falsa de 20 dólares , um menino de 5 anos que foi dirigido à sua morte por uma socialite impaciente e criminalmente irresponsável e despencou do 10 andar de um prédio porque estava querendo ver sua mãe) e mais de 1000 mortes diárias por Covid-19 no Brasil.

Isso sem contar 3 assaltos sofridos por meus vizinhos na tão celebrada zona dos Faria Limers,em plena luz do dia e horário de semi-Rush.

Depois da morte brutal e ignorante de George Floyd, o mundo todo incluindo a maioria de celebridades postou em suas mídias sociais #blacklivesmatter. E foi isso. Com exceção de alguns poucos que realmente lutam pela causa e estão fazendo a diferença em ONGS e ações contra o racismo, a maioria está lá para fazer bonito na fita.

Porque eu digo isso? Porque eu vi em inúmeros perfis de conhecidos meus esse tal do post em tela preta, o repost do repost de Black Lives Matter. E eu digo para vocês: esses  estão cagando para o movimento. De verdade. Pior, ainda já fizeram piadinha com negros no passado, ainda fazem, e ainda carregam esse racismo velado que o brasileiro, ou melhor, o latino americano tem.

Por outro lado, tem conhecidos meus, que poderiam sim ostentar esses posts grandiosos  de militarismo do bem com dignidade, porque sim  fazem parte de movimentos contra a discriminação racial, que inclusive são casados com negros e negras. E no entanto, optaram por não fazê-lo. Porque? Talvez o mesmo motivo porque eu também não enchi minha timeline do Instagram com isso. Não queremos usar a desgraça absurda que George Floyd foi submetido para nos pagar de bonzinhos e ganhar like e admiração de terceiros.

Porque quem é contra a discriminação sempre foi, e não precisa fazer propaganda de si mesmo  para demonstrar sua idoneidade.

Sim, existem muitos que fizeram de coração. Tem uma amiga minha que tem todo o direito de postar em todas as suas mídias sociais. Ela, loira, adotou uma linda criança negra de cabelos cacheados de boneca há 5 anos atrás  Tem outros, que apesar de nenhuma ação significativa, talvez tenham um respeito genuíno e sim postaram em suas timelines para tentar fazer a diferença e engrandecer um movimento que tem sua virtude.

Contudo, penso se esse movimento não foi desgastado pela própria hipocrisia da humanidade e já virou jogada de marketing pessoal da maioria das pessoas.  Vamos saber: daqui a 3 anos, ainda haverão outros George Floyds?  Infelismente, acho que há uma grande chance desse movimento bonitinho ser apenas faísca e daqui a alguns meses, tudo volta ao mesmo normal hipócrita.

Eu realmente tenho que comentar agora da truculência norte-americana. Talvez existam George Floyds brasileiros, talvez esse mesmo crime ´barbaro ocorra em terra brasileira . Mas tinha que ocorrer nos Estados Unidos.

Não quero destratar a América: tenho amigos de longa data norte-americanos de índole inquestionável, e meus pais dizem que o único país onde morariam fora do Brasil seria os EUA.

Contudo, eu vejo um racismo truculento e muito mais escrachado do americano contra negros, asiáticos e latinos. Ou seja, quem não é caucasiano, é lixo. Não são todos, talvez nem a maioria. Mas é uma minoria que faz estrago.

Eu sou brasileira e moro no Brasil há 43 anos, exatos de minha idade atual. Talvez eu sofri algum tipo de racismo na infância com a estupidez inocente de crianças malcriadas , e desde a adolescência eu jamais sofri algum racismo no Brasil que me afetasse. Talvez um preconceito velado por ser amarela, por ser a CDF da turma, enfim.

Mas nos EUA eu sofri cerca de 3 situações onde o racismo foi claro e sim, agressivo e descarado por eu ter etnia asiática.

A última delas lembro porque foi recente:  estava eu toda feliz, em 2018, no aeroporto de Chicago para conhecer aquela cidade de arquitetura magnífica.  Tinha uma pequena fila na imigração, e vi família de loiros e negros serem liberados tranquilamente. Na minha vez, o policial fechou a cara e de maneira bem agressiva, me perguntou o porquê de tantos carimbos no meu passaporte e porque estava viajando sozinha. Em vez de responder que eu me bancava sozinha e problema dele se não gostou, eu me resignei a dizer que sim, fui para todos aqueles países e sim, fui para Nova York 3 vezes em 2 anos.

O policial continuou com um interrogatório agressivo e sem qualquer paciência para um inglês mais espaçado: porque eu estava viajando sozinha, se eu queria arranjar alguém para casar e ficar por lá, qual era a minha ocupação que me permitia viajar tanto. Revistou minha bolsa, pediu para que mais 2 policiais me entrevistassem também.  Vi perto de mim uma senhora asiática de mais de 60, 70 anos também ser parada e questionada de maneira muito agressiva.

Antes que me perguntem, não . Eu não fui discriminada porque estava sozinha e era mulher. Antes de mim, 2 mulheres loiras sozinhas e com um inglês bem inferior ao meu passaram rapidinho e com um sorriso dos policiais.

E não, não dei nenhum motivo para os policiais me tratarem daquela maneira. Estava vestida dos pés à cabeça, tinha todas as reservas de hotéis e o voo de volta ao Brasil que me obrigaram a provar que eram verdadeiros, e dada minha experiência com inúmeras alfândegas do mundo todo e inclusive nos EUA, eu jamais tive um tratamento como tive com a alfândega em Chicago. Tive que falar com mais 3 policiais, que vencidos pelo cansaço e pela minha paciência de não pisar em falso, me deixaram ir.

Na saída, encontrei a senhorinha asiática que também foi liberada, depois de verbalmente humilhada pelos policiais. Ela estava em prantos, dizendo que jamais foi tratada dessa maneira.

A minha vontade foi de mudar imediatamente minha passagem e voltar para o Brasil, sem deixar um único e miserável centavo para aquele país de racistas de merda.

Foi bom que não o fiz. Chicago se mostrou diferente daquele aeroporto, e fui  maravilhosamente tratada por todos os locais da cidade, que “quase” me fizeram esquecer desse incidente.

Me senti culpada de não ter denunciado esses caras. A questão é: como denunciar? Como provar que fui maltradada? E podendo arruinar minhas férias, deixei pra lá.

Depois eu fiquei pensando. Eu sofri um racismo que foi um interrogatório escrachado em um aeroporto e ok. Saí ilesa. Vamos combinar que o racismo que o latino e o asiático sofre são completamente diferentes do racismo sofrido pelos negros. É outra escala, outra forma de degradação e humilhação.

Como eu disse, não é a maioria. A maioria dos norte-americanos que conheço e são meus amigos são pessoas do bem.  Mas existe essa minoria que estraga. Existe essa minoria que esmaga o pescoço de George Floyd, que nos humilha em aeroportos porque podem, e são protegidos por Trump, vários extremistas, e inclusive artistas que ainda tem a cara de pau de postar “black lives matter” na sua timeline. A atriz Lea Michelle do extinto seriado Glee foi uma delas, e prontamente rechaçada por várias ex colegas discriminadas.

Volto a dizer que neste movimento que teve um elo bom, há muito lobo em pele de carneiro aproveitando o rebanho.

Eu acho que o Brasil tem muito a melhorar em diversos aspectos. A gente fala mal da gente mesmo, e temos nossa razão. Jeitinho brasileiro de merda, corrupção, preguiçoso. Contudo, fico aliviada por estarmos muito, muito longe do racismo escancarado e agressivo que alguns americanos permeiam e são coniventes.