continuous line drawing of happy woman dancing with umbrella

Me perdoem vocês, mas acho as redes sociais uma bênção. Vez ou outra, entre negões da piroca, fotos de bofes magia e correntes malignas, me compartilham conteúdos fantásticos. Um desses foi a palestra da Monja Cohen, falando sobre a responsabilidade sobre nossas vidas, e se você não pode fugir das adversidades da vida, você pode contudo decidir o que fazer com elas.

Isso me lembrou das situações mais estressantes que vivi. E o que vivi depois delas.

Sim, você está na merda. Na merda total. Não aquela situação de eterno descontentamento, mas algo anormalmente cruel aconteceu a você.

O seu carro foi roubado. Ou você conheceu um cara que parecia ser incrível, mas foi um tremendo pilantra. Ou você foi assaltada em sua casa. Ou você perdeu alguém muito próximo a você de maneira inesperada.

Numa pesquisa informal de rodinha de bar entre amigos, tirei uma média de 5 a 10 acontecimentos “traumáticos” na vida de uma pessoa normal, até os 40 anos. Ou seja, se você é um ser humano, você está sujeito aos dissabores e surpresas nem sempre agradáveis da vida.

A questão é: como você encara esses traumas?

Você deixa ele te corroer até os ossos, entrando em profunda depressão que dura meses, até anos? Ou toma isso como um aviso, uma bênção e muda sua vida?

Lógico que somos naturalmente seres humanos, e temos nossas fraquezas. Uma pessoa, por mais fria e racional que seja, tem seu período de luto, aquele onde mergulhamos nas raízes do mal, nas causas e conseqüências deste trauma,  nos infligimos com culpas e anseios, e nos punimos por atitudes tomadas ou não.

Mas na vida,como as uvas,  tudo passa. O fato de você martelar esse trauma na cabeça durante 1 semana ou um 1 ano não vai fazer você ir para o céu, nem para o inferno.

Eu pratico (e tento praticar) há muito tempo o lema , o que não nos mata, nos fortalece. Gosto de citar esses fatos traumáticos que relato a seguir, que aconteceram em minha vida, porque sou matemática e racional, e fazendo as contas do trauma versus o benefício que ele me trouxe, vejo que as situações traumáticas, embora longe de serem desejadas, são as que vão mudar a sua vida. Geralmente para MUITO melhor.

1)      Trauma – minha casa foi assaltada. 4 bandidos armados me renderam e me fizeram entrar = com meus pais, onde passamos 6 horas de terror e ameaças. No final, tudo de valor que tinha foi roubado, porém não fomos feridos.

O que poderia acontecer: Poderia eu ter entrado numa crise existencial e de depressão, me sentindo culpada pelo meu modo de vida, de voltar sempre tarde para casa, de facilitar a entrada dos ladrões. Poderia pensar nas jóias de família roubadas que nunca poderão ser recompradas, no sofrimento. Meus pais poderiam ter entrado em depressão, pensando na falta de segurança que  originou esse roubo. No que de pior poderia ter acontecido. Morte. Ferimentos físicos. Ataques.

O que aconteceu na prática: percebemos que a região não é segura. Não se dá para morar tranquilamente num bairro sem segurança, numa casa sem condomínio fechado. Em 3 meses nos mudamos para um apartamento e desde então nunca mais passamos por situação parecida.

LIBERTAÇÃO: fui finalmente morar sozinha. Ensaiei durante 10 anos me mudar, antes do roubo. Não o fiz porque meus pais não queriam que fosse morar sozinha, por receio de ter muito trabalho, por medo, medo, medo. E quando o fiz, me tornei uma outra mulher. Não imagino de forma alguma voltar a ser o que era antes, e se há uma daquelas ações que poderíamos mudar se voltássemos no tempo, era encarar o medo e ir morar sozinha com 25 anos, não 33, como o fiz.

2)      Trauma – morte inesperada de uma amiga próxima.

Ela tinha 7 anos a mais do que eu. Trabalhamos juntas numa empresa francesa, ela me indicou como estagiária. Não éramos exatamente melhores amigas, mas nos encontrávamos sempre, pois ela era irmã de criação de uma amiga muito próxima minha. Tínhamos perfis bem diferentes. Eu tinha 24 anos, cheia de achismos e querendo ganhar todas as discussões, e ela 31, uma pessoa extremamente plácida, simples e apegada à família. Um exemplo: se ambas fôssemos convidadas a largar tudo e morar em Paris, eu não pensaria duas vezes. Ela, não pensaria duas vezes em recusar a proposta.

Numa tarde de domingo, ela foi abordada num farol de esquina ultra tranqüila, na Zona Sul de SP, num bairro residencial. Estava voltando de um almoço com amigos. Os bandidos pediram para ela sair do carro. Ela o fez. De repente, 2 policiais apareceram. O bandido atirou nela para fugir e obrigar o policial a parar e socorre-la. Ela morreu 2 horas depois no hospital.

O trauma não foi exatamente porque perdi uma pessoa extremamente importante para mim. Foi porque uma pessoa que você vê quase todo dia, uma pessoa incapaz de reagir a um bandido ou fazer mal a outros de propósito, perdeu sua vida, sua respiração, não vai casar, conhecer o homem de sua vida, viajar para lugares e ver seus pais, porque ela foi premiada. Era para morrer. Assim, de repente.

LIBERTAÇÃO: eu digo que ela foi um anjo que apareceu em minha vida. Antes, eu era uma pessoa muito infeliz e angustiada, que se importava com a opinião dos outros sobre mim, que discutia com todos para ganhar simplesmente uma discussão, que remoia críticas negativas ou ações contra mim. Tinha muito medo de fazer as coisas, até simples, como ir num show num lugar que nunca fui ou marcar uma viagem sozinha.

E daí você vê que a vida é curta e pode acabar de maneira totalmente inesperada, e antes de qualquer atitude, você se indaga:

–         Porque estou protelando algo que quero fazer?

–         Porque estamos dando tanta corda para tanta gente que não nos merece?

–         Porque estou minhocando sobre este assunto? O que ele vai trazer de bom para mim?

–         Porque me interessa tanto saber o que tal pessoa falou de mim? Posso fazer algo a respeito?

–         Porque já se passou uma semana e estou martelando na cabeça porque ele não me ligou?

Posso dizer que hoje sou uma pessoa de ação fora do padrão. Faço muito mais coisas do que a maioria das pessoas, e tenho uma vida muito mais plena. Sou mais feliz, sou mais sossegada. Tenho meus anseios, eles fazem parte de mim, mas só para o meu crescimento. Gasto energia e pensamento só no que me fará bem. Pelo menos a maior parte do tempo. Sou Humana, né? Mas daí lembro dessa história e volto pra vida.